Nos dois primeiros parágrafos, o vestibulando até chega a tratar de imigração ilegal no País. No trecho seguinte, no entanto, o candidato se atém à receita do Miojo.
Ele escreveu: “Para não ficar muito cansativo, vou agora ensinar a fazer um belo miojo, ferva trezentos ml’s de água em uma panela, quando estiver fervendo, coloque o miojo, espere cozinhar por três minutos, retire o miojo do fogão, misture bem e sirva”. No parágrafo final, o aluno retorna ao tema proposto como se nada tivesse ocorrido. Das 24 linhas escritas, 4 são dedicadas à receita.
De acordo com o Ministério da Educação (MEC), a presença da receita foi detectada pelos corretores e considerada "inoportuna" e "inadequada", o que lhe provocou uma "forte penalização".
O ministério afirma que as competências mais prejudicadas foram as de número 3 e 5, que, entre outras coisas, mediam o poder que o candidato detinha para selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista e também elaborar uma proposta de intervenção para o problema abordado, respeitando os direitos humanos e considerando a diversidade sociocultural. Cada uma das cinco competências avaliadas pelo MEC possui a pontuação máxima de 200 pontos. Nas citadas, o candidato obteve 100 e 40 pontos, respectivamente.
O MEC diz ainda que, em sua totalidade, o candidato não fugiu ao tema e não feriu os direitos humanos. Segundo a pasta, é preciso considerar que a análise de texto é feita sobre o todo, com foco no conjunto do texto, e não em cada uma de suas partes.
Para Rogério Chociay, professor aposentado do Departamento de Letras da Unesp e especialista em redação de vestibular, a análise do conjunto foi justamente o que faltou para que o texto fosse mais penalizado. "No momento em que o estudante opta por inserir a receita no meio do seu texto, ele quebra o processo argumentativo e o princípio da dissertação e não configura um texto como um todo", diz. Segundo o professor, se o mesmo ocorresse nos vestibulares das principais universidades públicas no País, o aluno teria seu texto severamente punido ou então reprovado.
Nota mil
Redações com nota máxima e erros de português também foram reveladas pelo O Globona edição de ontem. Os textos apresentavam erros de grafia, como “rasoável” (em vez de razoável), “enchergar” (em vez de enxergar) e “trousse” (no lugar de trouxe). Várias textos apresentavam ainda graves problemas de concordância verbal, acentuação e pontuação, segundo o jornal.
Sobre os critérios de correção, o MEC esclarece que é preciso considerar que "a análise de texto é feita como um todo e que eventuais erros de grafia não significam que o aluno não domine os padrões da língua". De acordo com o ministério, uma redação pode ter a pontuação máxima mesmo apresentando erros em cada competência avaliada. "A tolerância deve-se à consideração, e isto é relevante do ponto de vista pedagógico, de ser o participante do Enem, por definição, um egresso do ensino médio, ainda em processo de letramento na transição para o nível superior."
Segundo Chociay, os erros encontrados nos textos que alcaçaram a pontuação máxima evidenciam o pricipal problema do Enem: o seu "gigantismo". Para o professor, a abrangência da avaliação esbarra na questão do treinamento dos corretores. "Os membros da banca corretora têm de ser 100% competentes no que se refere ao domínio da língua portuguesa. Quando se fala da correção de milhões de redações, isso é algo difícil de se garantir."
Para o professor, no entanto, caso os corretores acreditassem que os erros não prejudicavam a integridade dos textos, caberia a eles ao menos apontar as falhas e fazer o comentário. Isso, no entanto, não ocorreu.
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